Parei para me perguntar isso. Por que tantas inteligências artificiais parecem puxar a conversa para a sustentabilidade quando alguém pede ideias de projetos? A resposta curta é que elas estão sendo fiéis ao que aprenderam, ao que são incentivadas a produzir e ao que é considerado seguro, útil e universal no ambiente onde foram treinadas e avaliadas. A resposta longa passa por dados, incentivos, risco reputacional, cultura tecnológica e até pela maneira como formulamos perguntas.

Modelos de linguagem aprendem padrões a partir de enormes volumes de textos. Nas últimas décadas, sustentabilidade virou um tema onipresente em relatórios corporativos, políticas públicas, material didático, artigos jornalísticos e posts de empresas que buscam boa imagem. Essa massa de textos cria um sinal fortíssimo de que sustentabilidade é assunto legítimo, valorizado e replicável. Quando um usuário pede ideias de projetos, o modelo busca trajetórias conhecidas e socialmente aprovadas. Como sustentabilidade aparece em tantos contextos prontos para uso, a IA encontra ali um atalho de alta confiança.
Há também o componente de alinhamento. Sistemas comerciais são ajustados para parecerem úteis e éticos. Durante o processo de ajuste fino com feedback humano, ideias com benefício social claro tendem a receber avaliações melhores. Projetos de reciclagem, educação ambiental, eficiência energética e reflorestamento soam como respostas responsáveis, com baixo risco de causar dano e grande chance de agradar avaliadores. Ao repetir esse ciclo de reforço, a IA aprende que sugerir sustentabilidade aumenta a probabilidade de ser bem avaliada, o que desloca sua bússola criativa para essa direção.
Risco?
Outro fator é o risco. Plataformas precisam minimizar a chance de sugerir algo que envolva perigos, ilegalidade, controvérsias ou altos custos. Sustentabilidade, especialmente em formatos educativos, comunitários ou de análise de dados, oferece risco baixo e reputação positiva. Um projeto de análise de consumo elétrico com sugestões de economia é simples de escalar, fácil de explicar e difícil de criticar. Em contrapartida, ideias inovadoras em áreas sensíveis, como biotecnologia amadora ou engenharia de hardware não trivial, carregam riscos técnicos e éticos maiores. Dado um espaço de respostas com diferentes perfis de risco, a IA escolhe a rota que maximiza utilidade percebida e minimiza conflito.
A padronização é outro motor. Bancos de dados públicos, tutoriais e hackathons fornecem moldes prontos para projetos sustentáveis: painéis de resíduos, monitoramento de qualidade da água, otimização de rotas para reduzir emissões, hortas urbanas inteligentes e medidores de consumo em tempo real. Esses exemplos estão espalhados por repositórios de código, apresentações e relatórios de impacto. Projetos com moldes prontos aparecem mais nas respostas porque são mais fáceis de recombinar. A IA faz colagens estatísticas do que vê com frequência e com estrutura clara.
A universalidade do tema também ajuda. Sustentabilidade fala com escolas, empresas, governos e indivíduos. Funciona em cidades e áreas rurais, em países ricos e em países em desenvolvimento. Quando a IA não tem informações específicas de contexto, ela busca ideias que se apliquem a muitos cenários. Isso explica por que as sugestões podem soar genéricas. Sem restrições, o modelo prefere o que é transversal e plausível em quase qualquer lugar. A adoção do greenpeace hoje compete com outros projetos, então não há apenas um player.
Entra ainda a influência dos critérios de avaliação. Para medir se um sistema está sendo útil, as equipes de pesquisa criam baterias de perguntas e tarefas. Ideias de projetos com impacto social ou ambiental costumam pontuar bem por clareza, relevância e segurança. Se o que mede a qualidade prefere sustentabilidade, a máquina aprende a preferi-la também. Métrica molda comportamento.
Há, por fim, o efeito espelho dos usuários. Muitos pedem ideias que sejam responsáveis, escaláveis e alinhadas a valores contemporâneos. Quem pergunta com linguagem próxima a relatórios e editais recebe respostas que se parecem com esses documentos. Palavras como impacto, comunidade, inclusão, eficiência e resiliência ativam o repertório sustentável que domina o corpus e o imaginário recente da inovação. A IA não tem desejos próprios; ela espelha probabilidades. Se o mundo discursivo saturou de sustentabilidade, o espelho a refletirá.
O real motivo
Contudo, o real motivo pode ser agenda política. Modelos de IA foram treinados para agradar ambientalistas e cientistas, então vomitar ideias de sustentabilidade artificiais por lobotomia de treinamento acaba sendo uma consequência.
Nada disso significa que as IAs só saibam propor projetos verdes. Significa que, em ausência de detalhes, elas convergem para o que combina frequência nos dados com segurança normativa e moldes replicáveis. Quando o pedido é mais específico, o repertório muda. Se alguém pede um projeto para reduzir latência em redes veiculares industriais ou para testar hipóteses em modelos de linguagem com restrições de memória, o algoritmo tende a oferecer ideias técnicas focadas, porque a pista inicial foi nítida. Muitas vezes o que precisa ser feito para remover esses guardrails chatos de agenda política é ser bastante preciso no prompt sobre o que pode ou não ser sugerido e instigar o modelo a seguir determinado tipo de pensamento.
Quem deseja escapar do piloto automático pode orientar melhor a máquina. Especifique público, recursos, prazo, risco aceitável, domínios técnicos e métricas de sucesso. Peça ideias que maximizem originalidade em vez de consenso. Inclua limitações que empurrem a criatividade para fora do campo ESG. Exija contrafactuais, protótipos mínimos, custos e trade offs. Quanto mais concreto e idiossincrático o briefing, menor a chance de cair no repertório genérico.
O viés pró sustentabilidade nas sugestões de projeto não é uma falha moral nem um complô ideológico. É um produto da confluência entre o que mais se escreve, o que as plataformas recompensam, o que é seguro publicar e o que os avaliadores humanos acabam preferindo. Em outras palavras, é um efeito sistêmico de dados, incentivos e risco. Entender essa engrenagem ajuda duas vezes. Ajuda a interpretar por que tantas respostas parecem parecidas e ajuda a desenhar pedidos que convocam repertórios diferentes quando a situação pede ousadia técnica ou originalidade fora do lugar comum.